Lendo a postagem do Leonardo, feita há alguns dias aqui no blog, não pude deixar de me lembrar da canção "O mestre sala dos mares", de João Bosco e Aldir Blanc, lançada em 1973, em plena vigência da ditadura militar.
A composição conta a história de João Cândido e, em ritmo de samba-enredo, traz para o centro da cena a realidade histórica dos maus tratos que existiam na Marinha brasileira no início do século XX e que na escola nos ensinam muito à ligeira como sendo a "Revolta da Chibata". A letra da música ironicamente situa os fatos em um tempo longínquo, quase mítico ("faz muito tempo nas águas da Guanabara"), combina uma sucessão de imagens grandiloquentes ("conhecido como navegante negro/tinha a dignidade de um mestre-sala"...) com outras nem tanto ("glória à farofa, à cachaça, às baleias"...) e, com isso, mal consegue disfarçar a pesada crítica às estruturas de poder, que transformam muitas lutas em "lutas inglórias".
Claro que no contexto de uma ditadura militar uma música com tais características geraria desconforto entre a classe dirigente e, amparado no sistema repressor do Departamento de Censura, o governo tratou de cercear a letra da canção, que, após várias modificações (cortes, acréscimos - inclusive das imagens menos "louváveis" - e emendas), foi finalmente lançada por João Bosco no disco Caça à raposa, de 1973. A interpretação mais conhecida, contudo, é a que foi feita por Elis Regina no ano seguinte em seu álbum anual, intitulado Elis.
Ainda com relação à censura, é interessante observar as mudanças promovidas na letra original, conforme se pode ler abaixo, onde disponibilizo as duas versões (antes e depois da intervenção dos militares) para comparação:
Almirante Negro (Letra original)
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo marinheiro
A quem a história não esqueceu
Conhecido como o almirante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao navegar pelo mar com seu bloco de fragatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos negros pelas pontas das chibatas
Inundando o coração de toda tripulação
Que a exemplo do marinheiro gritava então
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o almirante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo.
O mestre-sala dos mares (Letra após a censura do regime militar)
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo feiticeiro
A quem a história não esqueceu
Conhecido como o navegante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao acenar pelo mar na alegria das regatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos santos entre cantos e chibatas
Inundando o coração do pessoal do porão
Que a exemplo do feiticeiro gritava então
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o navegante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo
Por fim, deixo disponível para audição uma gravação de "O mestre-sala dos mares" em interpretação de Elis Regina. Segundo consta, trata-se de registro não oficial do show Falso Brilhante.
Claro que no contexto de uma ditadura militar uma música com tais características geraria desconforto entre a classe dirigente e, amparado no sistema repressor do Departamento de Censura, o governo tratou de cercear a letra da canção, que, após várias modificações (cortes, acréscimos - inclusive das imagens menos "louváveis" - e emendas), foi finalmente lançada por João Bosco no disco Caça à raposa, de 1973. A interpretação mais conhecida, contudo, é a que foi feita por Elis Regina no ano seguinte em seu álbum anual, intitulado Elis.
Ainda com relação à censura, é interessante observar as mudanças promovidas na letra original, conforme se pode ler abaixo, onde disponibilizo as duas versões (antes e depois da intervenção dos militares) para comparação:
Almirante Negro (Letra original)
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo marinheiro
A quem a história não esqueceu
Conhecido como o almirante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao navegar pelo mar com seu bloco de fragatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos negros pelas pontas das chibatas
Inundando o coração de toda tripulação
Que a exemplo do marinheiro gritava então
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o almirante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo.
O mestre-sala dos mares (Letra após a censura do regime militar)
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo feiticeiro
A quem a história não esqueceu
Conhecido como o navegante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao acenar pelo mar na alegria das regatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos santos entre cantos e chibatas
Inundando o coração do pessoal do porão
Que a exemplo do feiticeiro gritava então
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o navegante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo
Por fim, deixo disponível para audição uma gravação de "O mestre-sala dos mares" em interpretação de Elis Regina. Segundo consta, trata-se de registro não oficial do show Falso Brilhante.
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